Olá você, meu leitor!
Estamos na 5ª. edição dessa sequência de textos, escolhemos nessa série explorar o tema das Empresas Familiares, em especial investigamos e sintetizamos aqui as principais fontes de conflitos que acontecem nos ambientes da família e da empresa. E aí chegou a vez de falar sobre os conflitos ligados a questões financeiras.
Começo por uma provocação, citando um dito popular:
“Casa que falta pão, todo mundo grita, ninguém tem razão” (Autor desconhecido)
O sentido aqui é o de que na escassez, a crise se instala e pode acontecer que a racionalidade seja colocada de lado, e nessa situação o diálogo de surdos é que prevalece.
E que tal esse outro:
“Herança, queima a mão e gela o coração” (Autor desconhecido)
Nesse se faz referência ao fato de que disputas por heranças podem trazer desgosto, rancor e afastamento entre os familiares, corroendo os laços afetivos.
Pois é, os conflitos financeiros estão entre as causas mais comuns de desavenças em empresas familiares. Esse tipo de organização tem dinâmicas complexas, onde o lado emocional e as relações pessoais interferem diretamente na gestão e nas tomadas de decisão. Vamos explorar a seguir então algumas das principais causas de conflitos financeiros nesse contexto e possíveis formas de mitigá-los.
Causas de Conflitos Financeiros em Empresas Familiares
- Distribuição de Lucros: Em muitas empresas familiares, a distribuição de lucros é uma área de grande tensão. Nem todos os membros da família podem estar ativamente envolvidos na gestão ou nas operações da empresa, mas ainda assim esperam uma parte dos lucros, e para esse fim constroem uma narrativa para sí e para os demais, que pensam assim suportar a legitimidade essa expectativa. Aqueles que trabalham diretamente no negócio frequentemente sentem que devem ser mais recompensados do que os outros membros da família que não estão tão envolvidos. Também se diz que cada familiar tem uma “fantasia” diferente com relação à empresa, quem está dentro tem uma, quem está fora tem outra, mas todos têm, mesmo que não a demonstrem com frequência.
- Diferenças nos Objetivos de Longo Prazo: Os fundadores e a primeira geração podem ter uma visão mais conservadora, preferindo reinvestir os lucros para garantir a continuidade e crescimento da empresa. Já as gerações mais novas, por vezes, preferem obter mais retorno imediato, optando por desfrutar mais da riqueza no curto prazo do que investir no futuro, o que pode causar atritos. As diferentes visões sobre o que deve ser feito com o dinheiro da empresa muitas vezes levam a conflitos sérios. Elas precisam ser mapeadas, compatibilizadas com muita habilidade, muito diálogo e um fluxo claro e constante de informação a respeito das estratégias e o contexto em que opera o negócio da família, o qual em geral exige um alto grau de competitividade de seus players.
- Salários e Benefícios: A questão da remuneração de familiares que trabalham na empresa também pode ser um ponto delicado. Muitas vezes, não há uma política clara sobre a carreira, sobre os níveis de autoridade e responsabilidade dos cargos e os decorrentes salários e benefícios indiretos, o que pode gerar sentimentos de injustiça e comparações com o que outros funcionários ou mesmo membros da família estão recebendo. Também acontece com frequência de que quem está na direção executiva não enxergue relevância em conduzir pesquisas de mercado para balizar a remuneração que pratica, preferindo fazer escolhas arbitrárias, o que invariavelmente é indefensável e ainda acirra os ânimos.
- Necessidades Pessoais x Necessidades do Negócio: As finanças pessoais dos membros da família frequentemente se misturam com as da empresa. Isso pode levar a decisões de retirar dinheiro da empresa para cobrir despesas pessoais, o que enfraquece a capacidade financeira da organização pois para equilibrar essa retirada extra e não prevista, outros sócios também fazem saques proporcionais não planejados. Quando um membro da família tem com frequência mais necessidade financeira de que outros, isso pode gerar conflitos sobre a gestão desses recursos.
- Falta de Transparência: Em muitas empresas familiares, os processos financeiros não são bem documentados ou comunicados de forma aberta. Essa falta de transparência e de accountability pode gerar desconfiança entre os membros da família, levando a suposições incorretas e suspeitas de má administração ou favorecimento. Nesse contexto pode também acontecer de que o membro da família responsável pela gestão financeira fique ainda ressentido pela possibilidade de desconfiança pelos outros membros da família e sócios.
- Sucessão e Controle A preparação para a sucessão é outro ponto crítico. Quando um fundador está se aposentando, questões sobre quem controlará os recursos financeiros e como serão distribuídos podem criar tensões entre os herdeiros. Se não houver um plano de sucessão bem estabelecido, os conflitos podem se intensificar e se cristalizar à medida que as gerações se sucedem.
Como Mitigar Conflitos Financeiros em Empresas Familiares
- Governança Corporativa: Implementar uma estrutura de governança sólida é essencial. Isso pode incluir a definição clara de estrutura organizacional, políticas de gestão, estratégias, processos nivelados pela melhores práticas de mercado, implementação de conselhos consultivos ou de administração, com a mediação de membros externos, que ajudem a garantir que as decisões financeiras sejam baseadas no interesse do negócio e não apenas nas necessidades extravagantes de consumo da família. Uma governança forte traz mais imparcialidade e ajuda a evitar o favorecimento.
- Política de Remuneração Clara: Estabelecer uma política clara e justa para salários e benefícios dos membros da família que trabalham na empresa, baseada em referências de mercado, ajuda a reduzir as percepções de favoritismo e os excessos. Isso também contribui para que as pessoas compreendam as razões por trás de cada decisão financeira.
- Planejamento Sucessório: Um plano sucessório bem desenhado não só prepara a empresa para a transição de liderança, mas também para a distribuição de patrimônio de forma justa. Quanto mais cedo essas questões forem abordadas, e mais efetivo for a comunicação entre os membros da família, menos chance haverá de conflitos futuros. É importante ter conversas abertas e transparentes entre as gerações.
- Separação das Finanças Pessoais e Empresariais: Incentivar uma clara separação entre as finanças da empresa e as finanças pessoais ajuda a evitar a retirada excessiva de recursos para atender a necessidades pessoais de curto prazo. Isso pode ser feito através de um comportamento mais disciplinado com políticas rigorosas para o uso dos fundos da empresa.
- Comunicação Aberta e Transparência: Ter uma comunicação aberta e transparente sobre as finanças da empresa é crucial para construir confiança entre os membros da família. Capacitar os membros da família para que sejam aptos a compreender relatórios financeiros regulares e reuniões familiares podem ajudar a reduzir mal-entendidos e a manter todos os envolvidos no mesmo nível de informação.
- Mediação de Conflitos: Quando os conflitos surgem, é importante abordá-los de forma estruturada. Em alguns casos, pode ser útil trazer mediadores externos, que são imparciais e podem ajudar a negociar soluções que atendam a todos os lados. Eles podem facilitar o diálogo, podem manter o foco nos fatos e dados, afastando-se do envolvimento emocional e evitar assim que os conflitos se intensifiquem.
Os conflitos financeiros em empresas familiares são inevitáveis em algum grau, mas podem ser geridos de maneira eficiente com uma estrutura de governança adequada, políticas claras e comunicação aberta. O desafio reside aqui é criar um equilíbrio entre o sucesso da empresa e o atendimento às necessidades da família, sem deixar que o lado emocional comprometa prejudique as decisões que afetem a saúde financeira do negócio. Ao investir em planejamento e transparência, os conflitos podem ser minimizados, garantindo a continuidade do legado familiar em benefício das futuras gerações também.
Nas próximas semanas seguiremos desenvolvendo o tema dos conflitos nas empresas familiares.
Inté!